diário vinte.
Não sei se sabes que dia é hoje, se sabes que passaram 5479 pores-do-sol
desde aquele 31 de maio. 15 anos. Meu deus, o tempo voa. E 15 anos depois era
capaz de te contar esse dia, esse fim-de-semana, segundo a segundo, momento a
momento. Com mais facilidade volto a cada instante, do que faço o luto destas últimas
três semanas. Recuso-me, não quero, não aceito. Como dizer adeus, se tu és a
melhor parte de mim? Se todos os dias existe um segundo que te odeio e todos os
dias me deito a agradecer por existires e te poder amar? Tanto, tanto para
dizer e não será hoje. Todas as palavras pensadas, sentidas, esperadas se
esfumam cada vez que penso que amanhã não te vou ver. Que não estás em simples
férias. Que as coisas mudaram. Como se fosse possível mudarem mais. Não quero
dizer-te nada e quero dizer-te tudo. Que não me esqueço de ver o carro partir e
sentir o chão tremer. Que não me esqueço de te ver sorrir e de saber que isso
era a minha vida. Que não me esqueço que amar-te é o melhor que a vida me deu. 15
anos. 5479 dias. 131.496 horas. 7.889.760 minutos. 473.385.600 segundos. Exactamente
da mesma maneira. Malae
Diário dezanove.
O Valladolid desce de divisão e tu sais de cena. Não há coincidências ou dia tinha mesmo que ser negro? Malae
diário dezoito.
Queria um abraço teu. Ficar em silêncio a teu lado. Ver-te sorrir. Queria estar longe daqui, desta melancolia, desta saudade. Malae
diário dezasseis.
Foi lindo, maravilho e fantástico. E, mesmo assim, nem metade do que tu merecias. Malae
diário catorze.
Não sei se sinto, se finjo que acho que não sinto. Anestesiada. De cada vez que olho para o relógio, e não faço outra coisa, só consigo pensar que é menos um minuto. Menos um minuto de ti. E o que se faz com um pensamento desses?! Malae
diário doze.
Não consigo parar de te imaginar ali, no túnel, pela última vez. O que vais sentir, o que se vai passar, como vais reagir. Tu. E todos os que te amam contigo. Dava tudo para estar aí, mas, na verdade, acho que não me chegariam 45 dias no campo para fugir do dia que menos quero que chegue... Malae
diário onze.
43 minutos. É esse o teu presente? 43 minutos de ti. Consigo ler-te em todos os teus gestos, antever alguns, recordar outros. 43 minutos de ti. 43 minutos de ti... Malae
diário dez.
Se conseguisses imaginar o que vai aqui dentro. O quanto custa este tic-tac sem fim. Na verdade, o pior de tudo é que não me dês tu a mão nesta altura. Porque eu sei que tu vais conseguir. Eu, tenho as minhas dúvidas... Malae
diário nove.
Ouvi-te. Sincero, directo, duro, ternurento, querido, sem papas na língua. Vi-te sorrir. Vi-te emocionado. Vi-te a ti, aquele que nem sempre mostras. E voltei a apaixonar-me. Malae
diário oito.
Gostava de te dizer um monte de coisas que nunca tive oportunidade de te dizer. Uma delas é que tenho muito orgulho em ti. Na pessoa em que te tornaste. Na pessoa ainda mais excepcional em que te tornaste. Sempre foste especial. Só apuraste. Malae
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E todos os anos se torna mais difícil. Saudades. (e, por favor, tomem conta dele.) Malae
diário sete.
Apetecia-me um doce. Na verdade, apetecia-me gelatina como morangos. Hoje, já saberás que aquilo é a coisa mais fácil de se fazer e não voltarias a dizer que é a melhor do Mundo. Mas a gelatina com morangos faz-me feliz. Traz sempre com ela um sabor mais doce do que tudo o resto. Ainda comes gelatina com morangos? Malae
diário seis.
Tenho saudades de te ver sorrir, tantas, tantas. Saudades de ver os teus olhos brilharem. Saudades de esticar um braço e ter-te ali a meu lado. E tantas saudades de te ouvir respirar, no meio do silêncio. Sabes, há sons que também eles nos salvam. (e tantas, tantas saudades de sentir o coração, o meu, bater...) Malae
diário quatro.
Já perdi algumas pessoas na vida, mas todas de forma repentina. Ninguém chegou perto de mim com uma sentença de morte, tornando todo o tempo seguinte um minuto de adeus. Mas é o que sinto desde aquele dia: que alguém te traçou uma sentença e que entrámos em total contagem decrescente. E é por isso que me mato eu para agarrar todos os minutos, para que eles não possam fugir. São tão estúpida, esqueço-me tantas vezes do essencial. Não há sentença nenhuma, preciso de repetir incessantemente. Nenhuma. Tu continuas a existir no mundo, tu, o teu sorriso, os teus olhos, o teu abraço. Tu continuas a existir no mundo e isso faz com que todas as voltas que a Terra dá valham a pena. Malae
diário dois.
Sentei-me no banco. No que foi nosso, no que é nosso, no que vai ser nosso. Estavas lá, de chapéu ao contrário, de calças de fato de treino enroladas, a brincar com um miúdo qualquer. Voltei a estar parada a olhar para ti e a pensar de que mundo vinhas. De onde terias saído para entrar na minha vida. De repente, viste-me e sorriste. Meu deus, sabes como ainda hoje dispara o meu coração? Ajeitaste-te no banco para eu me sentar e desataste a falar sem parar... Naquele banco onde estivemos tantas vezes, onde me ensinaste a ser melhor, onde me salvaste. Um simples banco. Tanto do que fui contigo. Malae
diário um.
Os minutos parecem dias. Estúpido. Há quantos milhões de dias, assim sendo, os meus minutos não parecem minutos porque não são contigo? Mas os minutos parecem dias. E mesmo assim o tempo voa. Porque todos esses minutos que parecem dias são, novamente, os meus últimos minutos contigo. Os meus últimos dias. Malae
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